10maio14 - Depois de 30 anos dedicados à prefeitura, médico é dispensado e diz que a saúde de Tubarão está doente

09/05/2014 12:04
Natural da cidade de Braço do Norte, o médico pediatra Dr. Luissaulo Cunha, há muitos anos decidiu adotar Tubarão para seguir carreira e constituir a sua família. Sempre muito atencioso e com um currículo invejável, ele já é um dos mais renomados na profissão do sul do estado. Como reconhecimento do seu trabalho ele recebe no fim deste mês, o título de Cidadão Honorário proposto pelo vereador Zaga Reis do PP. No entanto, mesmo apesar de quase 30 anos de serviços prestados na prefeitura, não foram suficientes para a administração de Olávio Falchetti aproveitar todo seu conhecimento e experiência. Ele atendia em vários locais como funcionário público e recentemente recebeu a desagradável notícia que seus serviços haviam sido dispensados, e com isso deixou de atender várias crianças, a maioria delas do Lar da Menina, onde prestava serviço nas quintas-feiras, além de outros locais. Luissaulo faz uma avaliação da atual administração e adianta que a saúde está doente. “Antigamente reclamavam de filas. Eu peguei esse tempo. Mas pelo menos os pacientes eram atendidos. Hoje tem fila. Mas não tem médicos e muito menos atendimento”, ressalta. O pediatra concedeu uma entrevista ao Jornal A Crítica, em seu consultório na Clínica Pró-Vida, e fala da sua carreira, dificuldades e outras administrações. 
 
 
A Crítica – Qual é a sua cidade natal?
Dr. Luissaulo – Sou natural de Braço do Norte. Na minha certidão de nascimento, Braço do Norte ainda era distrito de Tubarão (risos). O tempo passa muito rápido. Isso em 1952. 
 
 
A Crítica - Há quanto tempo o ocupa a função de pediatra? 
Dr. Luissaulo – Estou na carreira desde 1982. 
 
 
A Crítica – Como soube que tinha vocação para ser pediatra? 
Dr. Luissaulo – Os alunos entram na pediatria no terceiro ano. Passamos por uma espécie de entrevista para sabermos qual o caminho seguir dos vários existentes na medicina. Muitos alunos quando chegam nas crianças ficam perdidos. Quanto menor for a criança maior é a insegurança. Eu me identifiquei bem e por isso decidi optar pela pediatria. 
 
 
A Crítica – Quando os pais chegam ao seu consultório com uma criança chorando nos braços. De que maneira o senhor acha um diagnóstico? 
Dr. Luissaulo – São obstáculos que precisamos superar e aprender. Precisamos aprender e ficar atentos. Na verdade o choro de uma criança, nada mais é do que uma forma de expressão. É a voz da criança. É a forma de ela se comunicar. Precisamos ter paciência e identificar o que elas estão sentindo. 
 
 
A Crítica – O senhor chegou a ocupar a Secretária de Saúde em que época em Tubarão? 
Dr. Luissaulo – Na época era Secretaria Municipal de Saúde e Assistência Social. Hoje é separado, mas quando eu assumi eram juntas. 
 
 
A Crítica – Mas em que gestão o senhor foi secretário? 
Dr. Luissaulo – Foi na gestão do Ximenes de 89 a 92. 
 
 
A Crítica – Qual é a comparação daquela época para hoje? 
Dr. Luissaulo – A impressão que eu tenho e é que a área da Saúde parece estar abandonada. Recebo muitas pessoas que criticam e reclamam. A saúde está doente. 
 
 
A Crítica – Mas quais as reclamações que o senhor mais ouve? 
Dr. Luissaulo – Ouço principalmente que faltam médicos. Sem contar outras coisas como funcionários para atendimento no balcão, material de trabalho, entre outras reclamações. 
 
 
A Crítica – Mas como explicar a falta de médicos numa cidade que tem uma faculdade de medicina?
Dr. Luissaulo – Médicos faltam em todos os locais. E o principal motivo dessa ausência é a falta de condições de trabalho para um profissional que passa anos num banco de faculdade e cuida da saúde das pessoas. Isso precisa ser tratado com mais carinho e atenção. Se a saúde da população vai mal, a cidade também vai mal. É o reflexo uma da outra. É preciso dar uma estrutura boa. E pelo visto isso não ocorre atualmente em Tubarão. Falta organização para facilitar a vida das pessoas. Com saúde não se brinca. 
 
 
A Crítica – Mas nesse caso podemos dizer que os médicos também são culpados de uma certa forma? 
Dr. Luissaulo – De maneira nenhuma. Primeiro é preciso dar condições de trabalho. A mínima que seja. Mas tem que ter. Um salário digno para a função. Um plano de carreira hoje não vemos mais pelo menos em algumas administrações. É raríssimo ver algum médico se aposentar numa prefeitura.
 
 
A Crítica – Os médicos trabalham demais e são poucos remunerados? 
Dr. Luissaulo – Em algumas situações sim. Há poucos dias, um médico das primeiras turmas de medicina da Unisul, teve um infarto. Ele dava plantão aqui, ali, dormia pouco e chega uma hora que o corpo não aguenta mais. Mas isso é feito, pelo fato que profissional precisa trabalhar e muitas vezes pega carga horária excessiva. 
 
 
A Crítica – Outras cidades da região dão mais condições de trabalho do que em Tubarão? 
Dr. Luissaulo – Com certeza. Sem dúvidas. Não vou muito longe. Eu tenho dois filhos médicos. E, um deles, a minha filha, trabalha em Jaguaruna. Lá as condições são bem melhores do que as nossas aqui. Ela vai e volta todos os dias. Mas vai com prazer de trabalhar. 
 
 
A Crítica – Além da Pró-Vida, onde mais o senhor atende? 
Dr. Luissaulo – Atendo também no Ambulatório Infantil, em Oficinas, onde é o Sindicato dos Ferroviários. Atendo pela Unisul e no AMEI (Ambulatório Médico de Ensino Integral). 
 
 
A Crítica – O senhor ouve reclamações de alguns médicos amigos seus sobre as condições de trabalho, aqui em Tubarão?
Dr. Luissaulo – Recebo muitas. Chega ao cúmulo de muitos médicos nem poderem fazer exames de mamas ou ginecológicos em mulheres pelo simples fato de não ter cortinas nos postos. Isso é um absurdo, mas é verdade e revoltante. Muitos outros receitam remédios e os pacientes ficam sem tomar a medicação porque nos postos não tem. O problema está muito sério mesmo. 
 
 
A Crítica – Qual é a sua análise sobre o governo do PT federal com o Programa Mais Médicos? 
Dr. Luissaulo – Primeiro que não falta médico e nem precisava fazer este programa importando outros profissionais de outros países. Falta darem suporte e condições de trabalhos para os médicos brasileiros. O governo que der atenção merecida para a saúde vai ver sentir a diferença nas ruas e com muito menos protestos e rejeição. 
 
 
A Crítica – Então o senhor reafirma que não falta médico? 
Dr. Luissaulo – Claro que não. De maneira nenhuma. Médico tem. Faltam condições básicas e salário adequado. Eu vou dar um testemunho. Quando não tinha a municipalização da saúde, na época que nem o SUS existia, era o INAMPS, nós tínhamos 12 pediatras, entre eles, eu, Irmoto, Akilson que é o vice-prefeito hoje, Kanuto, entre outros. Todos trabalhavam vinculados ao Ministério da Saúde, ao INAMPS. Tinham filas, mas as pessoas eram atendidas. Hoje tem filas e não temos médicos no setor público. Só temos reclamações. Muitas pessoas iam de madrugada pegar fichas e eram atendidas. Quem não tem um plano de saúde hoje está à mercê da sorte. 
 
 
A Crítica – Como funcionário da Prefeitura Municipal de Tubarão, em que locais o senhor já atendia?
Dr. Luissaulo – Em Vários. Na Madre, Mato Alto, no posto de São Martinho, Congonhas, Combentu, Joana de Angelis e Lar da Menina. 
 
 
A Crítica – Qual o motivo do seu desligamento da prefeitura? 
Dr. Luissaulo – Eu sempre me dediquei em fazer um bom trabalho. Mas de uma hora para outra o prefeito Olávio não quis mais meu serviço e me dispensou. 
 
 
A Crítica – Qual motivo alegado pela atual administração?
Dr. Luissaulo – Disseram que eu não cumpria horário. Eu disse que cumpria como sempre cumpri. Eu atendia todas as quintas-feiras e estava cedido para Unisul, desde a época do prefeito Genésio Goulart. Eles sabiam disso há muito tempo. Muitas pessoas lamentam isso. Para provar que eu faço meu trabalho com muito carinho e dedicação, eu ainda atendo algumas crianças de graça. Sei que precisam de ajuda. E se o poder público que pode mais do que eu não faz, eu pelo menos tento fazer a minha parte. 
 
 
A Crítica – Como professor durante anos da Unisul, qual é a sua avaliação do curso de medicina para o município?
Dr. Luissaulo – Se não fosse a Unisul certamente a saúde teria problemas ainda maiores. Muitos cursos fomos nós da universidade que implantamos e de lá saem profissionais gabaritados e prontos para o mercado. Hoje muitos deles exercem funções que só vemos em cidades maiores. Mesmo assim poucos profissionais são aproveitados. Justamente pela falta de estrutura e falta de incentivo. 

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